Mexerica Doce: Como Não Confundir Carência com Suco de Laranja (e Outras Lições Afetivas)
- silvabragapaula8
- 14 de mai.
- 4 min de leitura
Atualizado: há 4 dias
Ou: É tudo tentativa, jato no olho e ajuste de ângulo. E no final, o que importa é que o gomo foi dividido.

Física afetiva: A mexerica que espirra
Descascar mexericas é um ritual que revela verdades sobre o amor: o primeiro jato de suco no olho sempre vem. É lei da física afetiva - tão inevitável quanto a gravidade puxando a fruta madura para o chão.
OS JATOS VERBAIS DA VIDA COTIDIANA:
Enquanto os dedos furam a casca, o aroma cítrico explode no ar, e na comunicação humana acontece algo similar:
CRÍTICAS → quando o grito real era "estou machucado"
EXIGÊNCIAS → quando o pedido era "estou com medo"
SILÊNCIOS → quando precisávamos falar (ou falas quando precisávamos calar)
Nós, veteranos das mexericas da vida, sabemos: certas dores (como o suco no olho) são inevitáveis no amor, mas repeti-las sem aprendizado é escolha.
ALQUIMIA AFETIVA
Meu laboratório particular ficava num ponto abandonado da ladeira. Tardes douradas, cascas no chão, dedos grudentos de tentativas.
A DESCOBERTA NO BANCO DESATIVADO:
Foi ali, entre gomos, que entendi o processo de transformação:
MINHA FRUSTRAÇÃO: mensagens não enviadas
MEU DESEJO: carinho
MINHA OFERTA: silêncios cortantes
Era como depositar moedas num cofre sem fundo, esperando que virassem ouro por pura vontade. O suco doce escorria enquanto eu transformava desejos em exigências secretas, e carência em prova de amor.
TABELA DOS SILÊNCIOS: GOMOS DA MESMA FRUTA
Assim como descascar mexericas exige paciência, na comunicação alguns silêncios são gomos de entendimento, outros são cascas vazias:
TABELA DOS SILÊNCIOS
E assim, enquanto descascava mais uma mexerica, entendi, anos depois, no mesmo banco: Há quem fique preso no ciclo automático (dos jatos de suco ou das palavras impulsivas). E há quem transforme o silêncio em ato de coragem - não como fuga, mas como escuta ativa. Há uma dignidade sagrada em calar necessidades quando o propósito é observar e não moldar.
Observar é um ato de humildade: é conter o impulso de exigir — de mim ou do outro — respostas que ainda não cabem no tempo certo. "Ainda não entendo meu próprio desejo" - essa admissão quieta reconhece que o solo do outro pode não estar preparado para receber minhas sementes.
Lacan lembrava que o desejo é um enigma; observá-lo é decifrá-lo letra por letra, não a golpes de vontade.
O FRUTO MADURO: COMUNICAÇÃO SEM ESPREMER
O suco doce da mexerica escorrendo pelo queixo me levou ao entendimento final: parceiros não são um estande de sucos. Não existe fruta perfeita, nem amor que não arda às vezes.
A ARTE DE SEGURAR A FRUTA:
Apertar demais = sufoca, exige, arde nos olhos
Segurar com medo = nunca experimenta o doce
Segurar com cuidado = permite que a doçura se revele naturalmente
COMUNICAR vs PROJETAR:
COMUNICAR (descascar com paciência):
Você assume que o outro não é adivinho (mas também não é inimigo)
Fala o que precisa, não como o outro deve entregar
Oferece espaço pro outro mastigar sua vulnerabilidade
Sabe que doar informação afetiva é diferente de cobrar reparação
PROJETAR (espremer até jorrar suco):
Confunde "eu me sinto sozinho" com "você me abandona"
Transforma desejo em dívida ("se me amasse, saberia...")
Usa a comunicação como termômetro pra medir amor, não como ponte
Expele suco ácido quando a fome é de outro nutriente

Há coisas que só se experimentam plenamente quando nos permitimos ser vulneráveis à sujeira, ao excesso, ao incontrolável. Chupar mexericas é um treino para os amores que valem a pena, aqueles que deixam marcas de açúcar e ácido na pele e, mesmo assim, fazem a gente repetir: "Mais uma".
O BANCO DA VIDA
Ainda me sento no mesmo banco às vezes, mas agora com uma diferença essencial: se alguém disser "Você devia ser diferente", eu só ofereço um gomo de mexerica.
O APRENDIZADO QUE FICA:
Algumas frutas não estão maduras para nossas mãos
Algumas conexões não estão prontas para este momento
Isso não é falha da árvore, nem do freguês
Apenas a vida nos lembrando que amor não é sobre completar vazios
RELACIONAMENTOS MADUROS SÃO COMO MEXERICAS:
Aceitar que vão escorrer alguns erros (suco)
Ajustar o jeito de segurar (comunicação)
Saborear o que importa: a doçura que fica depois
OFERTA FINAL
Qual é o seu banco de ônibus abandonado? O lugar onde você lembra que a vida não precisa ser complicada para ser boa?
E quando a próxima mexerica escorrer pelo queixo, lembre: amor não se exige, se oferece, gomo a gomo, sem medo de ficar com os dedos melados.
E sigo balançando as pernas, sabendo que o amor que vale a pena nunca é uma cobrança, é um fruto maduro, pronto para ser compartilhado.




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